TERMINAL - ABRIL 30/30 - 2019

By Tiago Ferreira - 30.4.19


Não me envolvo mais, não quero mais ter que ser, não desejo mais ter que dizer. Talvez eu devesse dizer as mentiras que sei para que fosse possível me sentir livre das obrigações que foram impostas a mim. Talvez eu devesse me fazer de dissimulado, pegar o ônibus errado e desaparecer. Talvez eu quisesse me fazer ausente, me quisesse desconhecido, esquecido e anonimo. E se de repente eu apertasse o botão deletar, será que eu conseguiria apagar tudo que escrevi? Se eu dissesse que enjoei de ser o que escolhi ser, será que seria possível me descaracterizar?

Cavei um buraco e me enfiei dentro. Me escondi de mim e deixei de me procurar. O buraco que abri em mim ainda aumenta a cada vez que sou feito de refém pela desesperança. O medo que deixei de fora do meu esconderijo ainda segue as pistas para a minha existência. Ainda estou vivo no preambulo de fim que imaginei, apesar de não saber ao certo como sairei do meu próprio esconderijo. Talvez eu tente colocar a cabeça do lado de fora para enxergar a direção que eu deveria seguir. Não sei mais se consigo querer estar em pé em um novo caminho, escrevendo uma nova história e transcrevendo cada nova palavra. Estou preso em mim por querer estar distante dos passos que dei.

Não me faça mais dizer o que senti ao sair da cena. Eu continuo firme no propósito de me fazer invisível. Continuo fugindo daquilo que já conheço, daquilo que me causa medo, receio e pânico. Eu sei bem como acabei encontrando a coragem para terminar o que não comecei, mas não sei mais se escrevo o restante da cena da maneira que imaginei. Eu só queria saber se posso deixar de contar mentiras, se posso deixar de atuar, de dissimular e se posso assumir a minha identidade. Estou preso na ambiguidade da minha própria vontade, da minha própria existência, que acabei me tornando resistência. Como resisto escondido no que deixei de ser? Como me faço presente estando ausente do meu próprio caminhar?

Eu continuo vivo. Ainda escuto. Ainda vejo. Só que meu coração agora pulsa dentro do pote que coloquei em exposição na prateleira. Sou refém de mim e ao mesmo tempo senhor do que escolhi ser. Estou em estado terminal. Preso no meu próprio medo, preso no meu próprio rancor, no horror que cultivei. A cena que finalizei corresponde ao ato final. Saí do palco sem receber aplausos. Estou ausente. Estou distante. Estou seguro.

Abril 30/30 - em sua segunda edição - chega ao fim no Limoções. Obrigado por ter prestigiado esse projeto trabalhoso e especial. Você viu inúmeras fotografias de autoria da Olívia Vieira. Quero agradecê-la por ter nos dado a chance de admirar suas belas capturas, de conhecer as peculiaridades que lhe alcançaram os olhos e por ter nos proporcionado a chance de ter conhecido lugares memoráveis.

Eu sou o Tiago Ferreira e idealizei o projeto "Abril 30/30" em 2018. Em sua segunda edição, o projeto publicou poemas e escritos. Todo o conteúdo está disponível aqui no Limoções.

Obrigado a todos. 

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