DESPOETIZADO

By Tiago Ferreira - 14.10.19


A dor se afastou, foi para longe, foi embora, pegou suas coisas e decretou viagem. As lágrimas secaram, não rolam mais, não escorrem pelo rosto. O medo não tem mais o controle, foi abafado, foi expulso, foi descaracterizado. Então o que tem?

Os dias poéticos não parecem mais tão próximos da realidade e o que é real nem sequer é capaz de se tornar poético. A poesia está de partida, a poesia está silenciada, a poesia ficou trancada no silêncio ou foi levada pelo vento. Quanto mais poético, mais lindo. Quanto mais real, mais poético. Estou preso na irrealidade e não sei mais onde está a poesia que eu cultivava, a mesma poesia que seguia compondo a minha estrada, a poesia boa que me fazia voar, me fazia sentir, me fazia sonhar. Estou aqui agora e acho que a poesia foi embora, se dissipou, foi poetizar outros ares, foi encher de coragem aqueles que ainda não tinham sido tocados pelo seu poder. 

E posso eu dizer exatamente o que? Não tenho tempo para brigar pela poesia, não tenho certeza se ela foi embora ou se eu me tornei incapaz de senti-la. Talvez a poética esteja passando despercebida pelo meu olhar cansado, pelo meu olhar sobrecarregado, pelo meu olhar rotineiro, pelo meu olhar comum. E posso brigar pela poesia se ela não tem sido natural? Não tenho o direito de dizer que fui deixado pelo eu-lirico, mas posso dizer que segui despoetizado sem perceber que a poesia de mim fugia. Então que eu não seja mais poeta, não seja mais autor, não seja mais escritor e que eu seja o único culpado por ser o primeiro ex-poeta que conheço.

Percebi que o dia amanheceu e eu já não sou a mesma composição de ontem. Sabe, não sei se a poesia sorria quando eu me fazia poeta.


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