ALÉM DA MORAL TENDENCIOSA

By Tiago Ferreira - 23.2.20

Fotografia de Olívia Vieira para o Limoções 2020.
Já faz algum tempo que o mal ou bem não são pautados por mim. Eles não têm aparecido em minhas composições com tanta frequência, não têm regido minhas crenças ou os meus sentimentos, eles não têm mais tido influencia sobre as minhas decisões e nem sequer têm me motivado de alguma forma em especifico. Estou distante das devidas definições que podem descrever cada uma dessas formas abstratas, mas, pelo menos até ontem, eu tinha a plena certeza de que o bem e o mal poderiam se caracterizar em formas que eu ainda desconheço. Talvez eu não tenha os superado, mas devo ter me conformado com sua existência, com suas características, com suas condutas e com suas possibilidades. Não estou mais esperando que ambos apareçam, que ambos me alcancem, que mostrem seu potencial, seu poder.

Acima de tudo que me cerca, sigo fingindo que detenho o conhecimento necessário para estar seguro. Sigo acreditando naquilo que me ensinou, me formou, me moldou e me fortaleceu, mas ainda não sei direito onde estou. Sei quem sou, sei quem quero ser, sei onde quero estar, mas ainda não sou capaz de estar onde queria. Tudo, durante um tempo, parecia ter várias entradas e apenas uma saída. Sempre me tentaram fazer acreditar que somos rodeados por escolhas limitadas, por caminhos redundantes, por sofrimentos predestinados e por alegrias escassas. Num mundo de possibilidades, cheio de ontens e hojes, formado por inúmeras maneiras de ver e de viver, aberto a infinitas interpretações e com espaço o suficiente para o pulsar de bilhões de corações, eu tenho preferido não estar aqui e nem ali. Ocupo meu espaço em algum lugar, existo em algum lugar, significo alguma coisa e sei que possuo determinado valor. Não seria tolo eu de desqualificar a minha existência e minhas posições, mas agora finjo que conheço a realidade além do bem e do mal. O que penso, o que falo, como ajo, como me visto, como quero, o que quero, meus sonhos, minhas crenças e tudo que conjugo em primeira pessoa é meu - mesmo que não pareça em alguns momentos.

Se estou diante de tudo sem conhecer tudo, prefiro não escolher. Prefiro estar distante das extremidades e poder ter a chance de caminhar daqui pra lá, de lá pra cá. Tenho enfrentado um momento em que tenho tido pouquíssimas palavras para dizer, para escrever e para definir. Encontrei uma brecha na minha realidade que tem me permitido permanecer distante de algumas dualidades. Ainda não sou um só no meio de tanta incerteza, mas agora sei que o resumo da história não precisa conter uma moral tendenciosa que consiste em glorificar o bem e invalidar o mal. Estou fugindo da radicalidade que foi cultivada em mim, mas não tenho esperado viver algo além das poucas certezas que me rodeiam. Não estou me invalidando ou tentando reescrever a minha história. Sei o valor de cada passo meu e sei bem que agora estou aqui. Tudo é sobre o agora e, pelo menos por agora, prefiro acreditar que o mundo não é constituído apenas de bem ou de mal.

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