IMPERATIVIDADE

By Tiago Ferreira - 30.10.20

A vida é de quem tem a garra para vive-la - e não estou falando somente de méritos. A gente corre, engole sapos, a gente sustenta a força, engole o choro, não diz o que quer dizer, não faz o que queria fazer e prioriza o que tem a obrigação de priorizar. São tantas as imposições reais, são tantas as imposições que nos impomos, tantos os medos e são tantas as frustrações que quase sempre evitamos nos encarar. Tem dias que parece que não vencemos, que não somos capazes de falar sobre vitória, sobre conquistas, sobre sonhos realizados, sobre como somos incrivelmente fodas.


Não, não quero falar sobre a autoestima, sobre a valorização das nossas conquistas ou sobre como a vida é realmente decepcionante. Existem coisas que não precisam mais ser ditas, ser destacadas ou discorridas num texto meu. Eu queria falar sobre os dias nublados que deixei de vivenciar por ter medo da chuva. Nunca naturalizei tanto a possibilidade de não querer, de não fazer, de não ser obrigado, de não justificar e apenas dizer não como tenho feito nos últimos meses. Nesse processo conturbado de entender a negativa que pode existir diante da minha vontade e/ou disponibilidade, descobri que o não é doloroso e prazeroso ao mesmo tempo. O não dói porque não conseguimos, pelo menos na maioria das vezes, usá-lo sem culpa, sem remorso, sem deixar de lado a obrigatoriedade escondida no sim. Sempre foram explicitas as imposições camufladas de necessidades, assim como sempre ficou explicito que temos que estar, ser, querer, responder e ter, mas, pelo menos hoje, sou capaz de perceber que não é uma verdade absoluta o uso do imperativo no meu cotidiano.

Peguei para mim a possibilidade de ser negativo, de vestir a negativa, de viver negativamente, de apenas ser uma pessoa atenta ao que é controverso ao sentido de obrigatoriedade, ao sentimento de alegria, ao pensamento good vibes. Uma história de vida não deve ser tendenciosa, não pode apenas explorar uma única possibilidade, não pode - por natureza - ser unilateral. O mundo deixa de funcionar se a gente decidir que ele funcionará de acordo com nossas expectativas, de acordo com nossas projeções, de acordo com nossas vontade, de acordo com nossas imposições. Por obrigatoriedade, o que rodeia quem somos sempre vai tentar estar acima das nossas vontades - e isso é a vida. 

  • Compartilhe:

VEJA TAMBÉM ESSES DAQUI

0 comentários