Como se seguíssemos uma receita, querem homogeneizar a dor. Querem que todos nós tenhamos os mesmos horrores, sintamos o mesmo medo e desistamos pelos mesmos motivos. É triste ver que a apatia vence a empatia a cada novo dia. E chamam de rede de apoio, chamam de desabafo necessário, chamam de amor. Não existem características únicas para quem simplesmente é visto como estatística, como número, como porcentagem. Criaram uma forma de minimizar a responsabilidade, de utilizar a impotência para justificar a negligencia, de se fazerem de interessados. Se a empatia está sendo manipulada, está sendo atrelada ao comodismo, como esperar que o amor floresça? Querem nos fazer acreditar que a importância se caracteriza pelo papel de ouvinte, pelas mensagens vazias de "como você está?", de ações que são vazias.
Teorizaram a luta daqueles que não consideram a possibilidade de apreciar a poética do amanhecer. Teorizaram as histórias de vida, as armas de batalha, as impossibilidades vividas. Banalizaram a dor de quem sustenta um sorriso no rosto, de quem viabiliza a vida pelos seus próprios esforços, de quem levanta da cama sem forças. Banalizaram o legado de quem venceu o rancor, venceu o sistema, venceu a tentativa de homicídio. Os amigos querem um caminho mais fácil para dizer que dão importância, os privilegiados querem uma forma fácil de enxergar a equidade. Se escondem atrás da correria do dia, os metidos a acadêmicos analisam na surdina os traços da dor, argumentam entre si a veracidade da história de outrem e objetificam o ser humano. Eles querem que as dores sejam uma só para que não precisem lembrar que cada número é um ser único.
Salve a alma de quem sabe o que vive e credibilize o caminhar de quem precisou deixar de andar.
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