
Eu só fui me identificar como negro aos 19 anos de idade. Antes disso, mesmo vivendo entre negros, eu não queria e nem imaginava ser um. Eu cresci entre baianos - e minha avó materna era pretinha -, mas eu não tive contato profundo com as origens do meu povo, com histórias dos meus ancestrais e muito menos se falava em ser negro. Todos eles, inclusive minha própria mãe, vieram da Bahia mas simplesmente viviam como se aquilo não passasse de uma mentira. O contato mais próximo que tive com as minhas raízes, antes dos 19, foi na culinária. Minha avó e minhas tias não conseguiam ignorar quem eram e de onde vinham quando se tratava de cozinhar. Minha mãe não gosta de mencionar que é baiana e diz - sem pestanejar - que não tem vontade alguma de voltar a sua terra natal. Ela justifica que a razão para tal desprendimento foram as dificuldades enfrentadas por eles na época - dificuldades que fizeram com que todos migrassem para outro estado. Cresci sendo filho de uma negra com um branco, vivendo entre negros, comendo como branco e completamente sem qualquer conhecimento sobre a cultura da minha gente.