SE EU TIVESSE A CHANCE DE NÃO VOAR, DESEJARIA VER ALÇAR VÔOS PÁSSAROS QUE APRENDERAM A VOAR NA MARRA

By Tiago Ferreira - 27.7.19


Ainda narro os sonhos que não tomei posse, assim como escrevo palavras que falam sobre as vezes que não signifiquei. O caminho vem cheio de vitória, vem cheio de histórias, cheio de personagens e ainda não é possível narrar a gratidão que carrego por ter sobrevivido diante de cada sensação dolorida. Sigo significando o que não foi definido como significado, e vejo além da facilidade de se viver ouvindo a realidade contida por cada narrador de suas histórias. Todo sonhador carrega as marcas da sua simplicidade, assim como o amanhecer do lutador apresenta a cada novo dia uma gama de impossibilidades. Motivação, expectativa, oração, redenção e mais uma briga pela sobrevivência. Não se pode resumir a mísera em aprendizado, não se pode resumir o caráter em uma explosão de ações impensadas e não se pode resumir a força sobrenatural que ainda faz minha cabeça erguida. Foi sem conhecer o futuro que o presente se preencheu de ideias, assim como a segurança da sua luta te garante a voz para dizer sobre si sentado no trono da sua verdade. Cada um é dono do seu trajeto e tem todo direito de decidir como certo ou errado as prepotências que imagina reduzir o significado de cada um dos seus passos

Os pedaços de mim que foram derrubados, os pedaços de mim que foram massacrados somente fizeram germinar o que de mim fui semeando por cada lugar que passei. De pessoa mal compreendida, de cidadão arrogante, de um monstro que se diz rei, eu estou sentado no trono da minha verdade. O pensamento critico foi construível diante do circulo vicioso provocado pela dor. Do lugar de onde eu vim não teve senhor que pudesse me calar, não teve castigo que me fizesse desistir de ser coragem e nem meu linguajar forjado pela força encontrada na rua foi capaz de me colocar no palco junto dos grandes nomes da cultura. Os pedaços de mim que seguem sendo pisoteados pela incompreensão fazem nascer cada certeza de Tiago em cada coração que contraria as leis que criei para ser único, para ser uma história impossível de se narrar. Realizo a devoção pessoal de poder estar presente em cada infortúnio, em cada dor, em cada incomodo e em cada trauma. Carrego o peso de ser gerador de drama, criador de cicatrizes e vou tecendo a história de vilania que me aprisionou na condição de ditador.

Eu avisei, escrevi, cantarolei, desenhei e me fiz ser compreendido. De contrapartida, eu não pude florescer, fui podado, fui sabotado e fui aprendendo a sobreviver diante da raça, diante da garra, diante do sangue que derrubei. Os pedaços de mim que andam por ai carregam a bagagem que não pudi sustentar e vão vivendo suas guerras sendo uma mescla de dor de cabeça com analgésicos, a própria doença que já me vitimou teme a minha presença porque foi vencida pela cura que criei. Está escura a visão que descreve sobre mim, daquele que não criou caos sem necessidade, daquele que matou sonhos a queima-roupa, que enterrou viva a esperança que sorria diante do espelho. Me deram sorrisos, me deram responsabilidades e aguardavam que eu me tornasse mestre da vida que não escolhi viver. Me fiz aprendiz do mestre que eu nem sequer conhecia, e acabei tomando o lugar dos holofotes.

Cresci sozinho, cresci flor, cresci espinho. Fui ficando jardim para me fazer inteiro, mas acabei preso na arrogância das minhas próprias conclusões. Despetalaram as minhas flores para fazer com que minha existência tivesse o poder de decidir sobre a vida de quem não me viu além de jardim. Eu sou pessoa traumatizada, enraizada na dor constante que dói a cada novo dia, a cada novo sorriso, a cada nova expectativa. Perdi as forças, perdi as respostas e ainda não espero a caridade como uma única salvação, não espero o olhar de lamentação, pois eu viro o jogo depois que escolho deixar a minha resistência falar. Não quero competir com as crenças alheias, não quero ter o poder de contestar o caminho que não trilhei. Preciso ver brilhar o sol, assim como quero receber o brilho das estrelas que não sou. Se eu tivesse a chance de não voar, desejaria ver alçar vôos pássaros que aprenderam a voar na marra.

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