QUE SEJA BENDITO

By Tiago Ferreira - 29.1.20

Fotografia de Olívia Vieira para o Limoções 2020.
Agora sustento as minhas vitórias, assim como trago com orgulho todas as minhas derrotas. Queria ser mais detalhista no meu balancete, mas acredito que não deixei passar qualquer detalhe. Hoje não me sinto cansado e nem desanimado, então estou disposto a discorrer sobre as características que analisei. Está tudo razoavelmente bem, ou simplesmente como deveria estar, e sinto orgulho do que pude construir ao decorrer da estrada. Quem diria que eu pudesse me sentir vitorioso depois de me sentir perdido, exausto e desorientado...

O que vejo olhando para trás são todas as minhas facetas. Fui grande diante da grandeza e fui pequeno diante da pequenitude. Fui camaleão diante de situações que eu jamais imaginei ser capaz de transpor. Fui aluno e fui professor. Fui terapeuta e desabafei com o terapeuta. Fui amigo e inimigo. Fui escritor e cheguei a cogitar desistir de ser escritor. Fui, como sempre, muitos em só. Não entendo ainda como fui capaz de ser eu sem deixar de ser, assim como não consigo explicar como fui capaz de ser muitos em uma única vida. Não é uma questão de polivalência. É uma questão de existência, de sobrevivência. Estou satisfeito com o que tenho a contar e sigo exaltando todas as páginas do livro que me compõe. Estou aqui resumido em um só, com um único rosto, com uma única personalidade e com uma única essência.

Foi crucial desistir quando precisei desistir, assim como foi essencial insistir em coisas que eu acreditava merecer a minha importância. Parei de caminhar quando o medo tomou para si o controle e permaneci calado quando deixei fugir de mim o controle. Conheci mais de mim, dos meus limites e dos meus traumas. Me desmontei e me montei inúmeras vezes para compreender acontecimentos e para digerir certas surpresas. Fui de encontro com a maldade conhecendo sua astucia, assim como consegui lutar sem armas. Me desfiz das artilharias para poder estar em pé sem ter que carregar o peso do horror e preferi não declarar guerra para o ódio. Olho para o que sou e percebo que muita coisa se desvencilhou de mim, e não tem me parecido errado e/ou ruim me sentir mais leve. Parece que sou maior agora e não tenho precisado ser algo além de mim.

O amanhecer do dia em que encerro mais uma primavera de vida me faz enxergar a importância das demais estações. Encerro ciclos que pareciam não ter fim e não tenho mais a sensação de que sou obrigado a almejar novos recomeços. O amanhecer de encerramento abre a chance de novas oportunidades, mas tudo já parece implícito que não sinto a necessidade de gritar ao universo as minhas necessidades. Estou diante do que fui ontem e só queria me agradecer por ter tido a coragem de não desistir do ciclo que se encerra no dia em que eu completo mais um ano de vida. Está tudo bem dito, então que seja bendito tudo que será sonhado. 

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