O TEMPO SÓ ANDA PARA FRENTE

By Tiago Ferreira - 22.11.23

A vida é aquilo que conhecemos - e eu ainda acrescentaria que é um emaranhado de sonhos, frustrações e potencialidades. Estamos respaldados pelo passado, vivendo o presente e expectando um futuro digno. A gente também faz balanços e pondera a respeito daquilo que devemos ou não cobrar de nós mesmos - e nem sempre somos capazes de nos humanizar no processo. Queremos, queremos e queremos. Persistimos sobre o querer, e isso não deve ser encarado como algo ruim. Querer ter, querer estar, querer ser e insistir no querer. Talvez agora estejamos falando sobre conquistas, então já vamos definir a vida como a maior delas. Sei que a vida é aquilo que já conhecemos, aquilo que se encaixa nas nossas rotinas, aquilo que se adequou ao que tínhamos como perspectivas e ao que conhecemos como esperança, mas também precisamos ver o agora.

Agora quero estar seguro. Segurança no meu presente para tentar chegar até o meu futuro. Segurança para estar psicologicamente preparado para receber o amanhã e a reaprender a fazer das minhas próprias tratativas combustível para estar, para expectar, para sonhar. Retomo nesse parágrafo um conceito que me movimentou durante um período da minha história: o tempo de cada coisa. Me vi atropelando e sendo atropelado e o que se decorria durante esse processo era o tempo. Certa vez meu pai ponderou: "o tempo só anda para frente" - e essa frase me foi um atravessamento. Me vi exposto e correndo em direção contrária ao que poderia ser o relógio da minha vida. Não sei ao certo o que é o tempo, mas sei que preciso estar em segurança para o decorrer. Estou na terapia, estou na universidade, estou neto, estou tio, estou irmão e amigo. Estou nos lugares e nos papéis que me cabem, mas entendo como parte do tempo de cada coisa o direito de estar no mínimo de mim, de doar aquilo que tenho, mesmo que seja pouco. Segurança é perceber que não é necessário performar e que é direito não vestir uma personagem dentro dos papéis separados para nosso tempo.

O tempo de cada coisa determina o ritmo, a intensidade, a força, a segurança e permeia a existência como uma proteção, uma licença para se recuperar o humano, o legítimo direito de ser e de estar. Insistir em performar foi um apontamento que me veio na cabeça quando meu pai me disse aquela frase, pois trazer comigo o peso da minha existência e ainda ter que suportar personagens é algo terrível. Posso querer cultivar o simples, sempre visando a reciprocidade do bem que me alcança e combatendo o mal que me quer da maneira mais segura: estando sensível e verdadeiro ao lado daqueles que compreendem a pequenitude daquilo que posso entregar no tempo de cada coisa.

[...]

No meu sonho mais antigo, eu conheço o ontem e concluo que ele continua sendo parte fundamental do amanhã. Não sei ao certo como compus as palavras da minha escalada pela a história de minha própria autoria, mas acredito que estou habituado em finalizar capítulos. Desde que entoei o canto do desencanto, nunca mais tive sonhos que me conduzissem para além dos meus próprios domínios. O desconhecido me cansa. O novo me deixa exausto. Na minha atual versão de homem adulto e responsável pelos meus próprios boletos, deixei de cultivar o fetiche pelo transcender ao novo. As páginas da minha história não estão condicionadas a serem preenchidas por aquilo que ainda não conheço. Eu quero estar mergulhado em mim, quero me sentir, quero estar comigo, quero me ouvir e me conhecer melhor. Me recordo com carinho do brilho em meus olhos toda vez que fui induzido a acreditar que a vida precisava perpassar o conhecido para que começasse a valer a pena, mas eu também me recordo com avidez de todos as dores que doeram em mim enquanto buscava o novo, enquanto buscava o que estava além de mim.

A vida é aquilo que conhecemos, é aquilo que acreditamos conhecer, é aquilo que fingimos ter domínio e é aquilo que de fato nos pertence. O sentimento de pertencimento gosta de ser provocado pelo futuro, mas é sobre o presente que ele deveria ser aplicado. Não tenho mais medo do desgosto e todas as impossibilidades não me assombram mais. Me assusta o fato de eu me sentir com meus pés tão firmes no chão em que estou pisando, mas nenhuma dor pode ser nova a partir daqui. Não tenho o desconhecido boicotado dentro das possibilidades que ainda me aguardam, mas não tenho que me preocupar com aquilo que não conheço, com aquilo que não me pertence. Eu poderia fazer uma lista com todas as tratativas do desconhecido que priorizei enquanto deixava passar batido o que realmente integrava a minha existência, mas prefiro listar os sonhos que tenho sonhado:

Para além daquilo que me aguarda no futuro, eu sonho com meus boletos pagos, meus horários em harmonia e com um bom prato de comida disponível ao findar do dia. Para além daquilo que tenta me seduzir, eu sonho com meu cabelo hidratado, com meu artigo publicado e um par de tênis confortável nos meus pés. Para além daquilo que não me pertence, eu sonho com minha volta para casa em segurança, com minha família completa e minha criança com um sorriso no rosto. (MEU SONHO MAIS RECENTE - LIMOÇÕES | 02/01/2022)

https://www.limocoes.com.br/2022/03/meu-sonho-mais-recente.html

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